segunda-feira, 13 de outubro de 2014

QUANDO É DETERMINADO O DIA, NÃO ADIANTA FAZER PLANOS E JOGAR CULPA EM NINGUÉM TODOS NÓS TEMOS QUE PASSAR POR ISSO.


Edição do dia 12/10/2014


Áudio revela últimos instantes do voo que levava Eduardo Campos

Fantástico obteve, com exclusividade, íntegra da gravação dos últimos instantes do voo. Áudio não deixa claro se arremetida do pouso aconteceu.

 

Dois meses depois do acidente aéreo que matou o candidato à Presidência Eduardo Campos, o Fantástico obtém com exclusividade a íntegra da gravação dos últimos instantes do voo, a conversa final entre os pilotos e a Base Aérea de Santos.
Tudo parece ir bem, até que o comandante avisa que vai arremeter por causa do tempo ruim. Depois disso, o operador de rádio chama o avião por dez vezes e não recebe resposta.
Copiloto: Devido às condições, nós vamos aguardar e chamaremos novamente, ok?
Foram as últimas palavras dos pilotos registradas pela Base Aérea de Santos. A conversa, que o Fantástico obteve com exclusividade, tinha começado 24 minutos antes.
Copiloto: Rádio Santos, bom dia. Papa Romeu Alfa Fox Alfa. Na escuta?
Papa, Romeu, Alfa, Fox, Alfa é a maneira como a aviação diz "PR-AFA", o prefixo do Cessna Citation que levava Eduardo Campos e a equipe dele. Rádio Santos é o operador de rádio da Base Aérea de Santos. É assim que eles se identificam durante toda a conversa.
O Cessna ainda estava voando alto, na área de controle de São Paulo, quando o copiloto, responsável pela comunicação, fez o primeiro contato para perguntar sobre as condições climáticas para pouso.
Copiloto: Bom dia. Gostaria das condições do Aeródromo, por gentileza.
A Base Aérea de Santos é um aeroporto militar e, apesar do nome, fica na cidade vizinha Guarujá. No local não existe uma torre para controlar o tráfego aéreo, só uma estação de rádio, operada por um militar, que passa informações para os pilotos sobre as condições da pista.
Rádio Santos: Santos ciente. A base opera sob instrumentos. Vento 240 graus, com sete nós.
Naquele momento, as condições de vento eram normais, mas a base operava por instrumentos. Como a visibilidade era baixa, os pilotos teriam que se guiar exclusivamente pelas antenas de rádio.
Dezoito minutos depois do primeiro contato, o avião descia em direção à pista da Base de Santos.
Copiloto: De seis mil para quatro mil pés, já liberado por São Paulo.
Durante a aproximação, um aviso:
Rádio Santos: Rádio Santos ciente. Atento a pássaros na cabeceira da pista.
Dois minutos depois, o copiloto se confunde ao passar o prefixo do avião.
Copiloto: Oufa, Fo, Alfa Fox Alfa, está na arremetida, ok?
E confirma a arremetida.
Radio Santos: Alfa Fox Alfa, confirma. Você vai arremeter?
Copiloto: Afirmativo.
Arremeter é quando o piloto desiste de pousar e dá uma volta para tentar de novo. Nessa situação, segundo a carta que orienta o pouso na Base Aérea de Santos, os pilotos devem subir de volta para 4 mil pés e recomeçar a tentativa. Mas o áudio não deixa claro se isso aconteceu.
Rádio Santos: Está prosseguindo para o... nova tentativa de pouso?
O copiloto começa a responder.
Copiloto: Devido às condições, nós vamos su... é...
Interrompe...
Copiloto: Nós vamos aguardar e chamaremos novamente, ok?
Rádio Santos: Rádio Santos ciente, comandante.
Eram 10h. Depois disso, silêncio. Os pilotos não fizeram mais contato.
A Rádio Santos chama o avião:
Radio Santos: Alfa Fox Alfa, Rádio Santos?
Nada. Ninguém responde. Chama de novo:
Rádio Santos: Papa Romeu Alfa Fox Alfa, Rádio Santos?
Mais uma vez.
Radio Santos: Papa Romeu Alfa Fox Alfa, Rádio Santos?
Foram 10 tentativas de contato. E do outro lado, nenhuma resposta.
Radio Santos: Papa Alfa Romeu Alfa Fox Alfa, Rádio Santos?
Na Base Aérea de Santos, a preocupação aumentava, como mostra um vídeo gravado lá dentro. “O jatinho está desaparecido. São Paulo não sabe, não pousou em Itanhaém”, diz um militar, funcionário da base.
Ele estava conversando com assessores do partido de Eduardo Campos, o PSB, que esperavam o jato chegar.
Assessor: Ninguém pode fazer contato visual?
Militar: Desse jeito? Não, não tem. Radar não pega aqui embaixo.
Próximo dali, no bairro do Boqueirão, em Santos, câmeras de segurança registravam o destino do Cessna. Na queda, peças do avião voaram por toda a vizinhança. Em uma foto deu para ver como ficaram as turbinas. Uma delas entrou entrou em um apartamento, arrebentou a parede da cozinha e da sala.
O Fantástico esteve no local dois dias depois do acidente. Agora, dois meses depois do acidente, o apartamento começou a ser reformado. Moradores das casas atingidas têm direito a receber indenização pelos prejuízos.
O Fantástico teve acesso a apólice de seguro do avião, que garante essa cobertura. É a mesma que está com a Justiça. O seguro prevê US$ 50 milhões, cerca de R$ 120 milhões, para vítimas.
“Vítimas que perderam seus entes queridos no acidente e também as vítimas que tiveram prejuízo material, que são as pessoas das casas da cidade de Santos”, diz Thiago Lacerda Nobre, procurador da República, Ministério Público Federal.
A apólice vence em dezembro de 2014. Está em nome da AF Andrade, uma empresa do setor agrícola que, em 2010, arrendou o avião. Ou seja, não era de fato a proprietária até que terminasse de pagar as parcelas para a fabricante Cessna.
“A propriedade da aeronave é algo ainda um pouco nebuloso. A princípio, essa aeronave ela foi financiada junto à Cessna, com pagamento de parcelas por um empresário e ela teria sido vendida para outros empresários”, explica o procurador.
Os outros empresários são João Carlos Lyra e Apolo Santana, empresários pernambucanos que tentavam comprar a aeronave desde maio de 2014. Eles emprestaram o jato para a campanha de Eduardo Campos.
O advogado da AF Andrade informou que já está comprovada a transferência de arrendamento para os empresários pernambucanos, e que a responsabilidade pelo seguro é deles. Os empresários de Pernambuco dizem que a transferência do avião não havia sido concretizada até a data do acidente.
Apesar disso, moradores do Boqueirão, disseram que estão sendo procurados pelos advogados dos dois empresários de Pernambuco para fazer acordos. A aposentada Júlia Nagamine recebeu a oferta e aceitou. “A gente está entrando em um acordo para não entrar na Justiça, para poder receber e dar andamento no que nós temos que arrumar”, conta.
Tem muito para mexer. O avião caiu no quintal da casa da dona Júlia. A aposentada mostra que em um dos locais da casa havia uma edícula, que tinha uma cozinha. “Foi tudo destruído”, lamenta ela.
Dona Júlia começou uma reforma por conta própria e agora está esperando o dinheiro do acordo. O advogado da família diz que o acerto tem restrições, mas vale a pena. “De um lado, elas vão receber quase que na plenitude o valor e danos materiais pretendidos, e de outro lado elas abrem mão de qualquer processo, inclusive uma eventual indenização por danos morais”, diz Marcelo Vallejo Marsaioli.
Já Maria Ester faz questão de receber pelos prejuízos materiais e morais que sofreu.
Maria Ester Bittencourt, psicóloga: Nós temos direito a danos morais sim, nós queremos também.
Fantástico: Vocês vão entrar na Justiça para brigar por isso?
Maria Ester Bittencourt: Vamos entrar sim. Se for preciso, sim.
A psicóloga, os pais e mais dois irmãos tiveram que abandonar a casa que moravam. No dia do acidente, o Fantástico entrou na casa da Maria Ester. A casa continua bem danificada.
Maria Ester Bittencourt: Aqui dentro está tudo desalinhado. Sete centímetros o chão afundou. Inclusive, agora o teto está quase desabando totalmente. Fizemos o orçamento, foi em torno de R$ 1 milhão, o prejuízo aqui, em torno disso.
Fantástico: Alguém já pagou para vocês alguma coisa?
Maria Ester Bittencourt: Não, ninguém pagou nada até agora.
Um advogado, especialista em seguros, consultado pelo Fantástico disse, que os moradores não precisam aguardar um contato dos responsáveis pelo avião. “A vítima que quiser ir a juízo contra a companhia de seguros de responsabilidade civil deverá fazê-lo, promovendo ação também contra os segurados”, explica o advogado Ernesto Tzirulnik.
Em nota, a seguradora Bradesco, disse que não passa informações sobre a apólice que o Fantástico teve acesso.
Enquanto os envolvidos discutem de quem é a responsabilidade pelo pagamento do seguro, Juarez Câmara, dono de uma academia de ginástica atingida, está sem o ganha pão.  “A academia toda está interditada. Simplesmente eu estava andando redondo, caiu um avião e parou, meu lucro cessou. Uns oito meses para fazer a recuperação toda”, conta.
Juarez, Maria Ester e Júlia sabem que vai demorar para recuperar o que foi destruído e que nada vai ser igual quando eles voltarem para casa e para o trabalho. “Coisa que vai ficar marcada para o resto da vida, porque em segundos aconteceu tudo isso. Paga o bem material, mas aqui na cabeça fica”, diz aposentada Júlia Nagamine.

 

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